Advogado considera inconstitucional a medida provisória que aumentou a alíquota da CFEM

Artigo analisa a a MP nº. 789/2017 que altera a Lei nº. 7.990/89 e 8.001/1990

Por Conexão Mineral 31/07/2017 - 17:30 hs
Foto: Advocacia Bremm
Advogado considera inconstitucional a medida provisória que aumentou a alíquota da CFEM
Valmor T. Bremm, da Advocacia Bremm

Por Valmor T. Bremm*

O presidente Michel Temer na terça-feira (25/07), editou três Medidas Provisórias que estabeleceram mudanças nas regras para mineração durante a cerimônia de lançamento do Programa de Revitalização da Indústria Mineral Brasileira. Entre os pontos definidos pelo governo estão mudanças nas alíquotas de royalties para exploração mineral, nas regras de licenciamento ambiental, além da criação de uma agência nacional de mineração e 23 alterações ao código de mineração.

Neste texto vamos analisar a MP nº. 789/2017 que altera a Lei nº. 7.990/89 e 8.001/1990, ou seja, a mudança da alíquota da CFEM – Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais, mediante Medida Provisória.

A Constituição Federal, em seu art. 20, § 1º, estabelece que “É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.”

Ocorre que a alteração da alíquota da CFEM, como a imposição de penalidades, foram efetuadas mediante medida provisória e não lei. A medida provisória é um ato normativo excepcional e emergencial de competência privativa do chefe do Poder Executivo que em casos reputados relevantes e urgentes poderá adotá-la, com força de lei sob condição resolutiva, devendo submeter de imediato à apreciação do Poder Legislativo para decidir sobre o seu destino: (1) aprovação, com ou sem alteração, convertendo-a em lei ordinária, (2) rejeição expressa, ou (3) rejeição tácita ou perda de eficácia retroativamente à sua edição por decurso de prazo.  

A medida provisória é um ato normativo excepcional cuja legitimidade é outorgada diretamente pela Constituição Federal de 1988, consoante a interpretação dos arts. 59, V, 62 e 84, XXVI.

A redação do caput do art. 62 da CF,  estabelece os requisitos formais de relevância e urgência, dando, em razão disto, enorme margem discricionária ao chefe do Executivo para definir o que seja relevante e urgente para a sociedade.    

O requisito de relevância pode ser entendido como a situação fática que possui repercussão na coletividade, que interessa e influi na vida de um número indeterminado de cidadãos, adquirindo status de interesse público. E o requisito de urgência pode ser compreendido como a situação fática que exige rapidez, celeridade e eficiência em sua apreciação, atendimento, pois, ao revés, com o decurso do tempo, poderá causar prejuízos, perecimentos de difícil ou irreversível reparação.

A Constituição Federal admite a edição de Medidas Provisórias em caso de relevância e urgência. Cumpre observar, desde logo, que os requisitos não são alternativos como na Constituição anterior. Portanto é necessária a presença dos dois requisitos simultaneamente para que o Presidente esteja autorizado a adotar Medidas Provisórias. Convém, de imediato, identificar os conceitos utilizados pelo constituinte.

Relevância, segundo esclarece o Dicionário de Língua Portuguesa, quer dizer: “Qualidade do que é importante, pertinente; característica do que é relevante”

Já urgência, conforme define: “1. qualidade ou condição de urgência 2. Necessidade que requer solução imediata; pressa 3 situação crítica ou muito grave que tem prioridade sobre outras; emergência

A urgência se refere ao momento, à medida deve ser iminente, não podendo ser adiada. Neste mesmo sentido, discursa Celso Antônio Bandeira de Mello, ipsis litteris:

[...] mesmo que a palavra contenha em si algum teor de fluidez, qualquer pessoa entenderá que só é urgente o que tem de ser enfrentado imediatamente, o que não pode aguardar o decurso do tempo, caso contrário o benefício pretendido inalcançável ou o dano que se quer evitar consumar-se-á ou, no mínimo existirão sérios riscos de que sobrevenha efeitos desastrosos em caso de demora.

A urgência deve existir para que a medida seja adotada, bem como para que entre em vigência.

A utilização da medida provisória em si não é inconstitucional, pelo contrário, é um dever-poder outorgado pela Constituição da República diretamente ao chefe do Executivo. A ilegalidade reside na utilização abusiva e em excesso, sem se atentar para os requisitos e condições preceituados constitucionalmente.

Como visto não estão presentes os requisitos para edição de medida provisória com fim de majorar a alíquota da CFEM, o que pode ser combatido mediante a propositura de mandado de segurança. Segundo jurisprudência e doutrina, direito líquido e certo é aquele resultante de fato certo e que pode ser comprovado de plano. Identificado o direito líquido e certo e sua violação ou justo receio de violação por autoridade pública, a segurança deverá ser concedida.

O Judiciário, sobretudo o STF, nega-se, na maioria dos casos que bate à sua porta, a realizar o controle judicial, quer dizer, a análise de legalidade sob o pretexto de que estaria adentrando o mérito administrativo, consistente na conveniência e oportunidade da matéria regulada além do mais a Súmula 266 do STF estabelece que “Não cabe mandado de segurança contra lei em tese.”, mas ocorre que estamos diante de uma MP-Lei de efeito concreto.

Frise-se, ademais, a necessidade de, em cada caso, distinguir entre as leis de conteúdo genérico das leis de efeitos concretos, ou autoexecutáveis. É que, apenas estás última, como é de curial sabença, refletem ato de natureza administrativa revestido da forma de lei, passíveis de impugnação pela via mandamental, posto revelarem real potencial lesivo. Dessarte, se o ato for apto a produzir efeitos diretos e imediatos em relação ao impetrante, como, v.g., atos de natureza proibitiva, aumento de alíquota, caberá à impetração do mandamus. 

“Lei de efeito concreto é a emanada do Poder Legislativo, segundo o processo de elaboração das leis, mas sem o caráter de generalidade e abstração próprio dos atos normativos. Ela é lei em sentido formal, mas é ato administrativo em sentido material (quanto ao conteúdo), já que  atinge pessoas determinadas (...) Leis dessa natureza produzem efeitos no caso  concreto, independentemente de edição de ato administrativo; na falta deste, o  mandado (de segurança) deve ser impetrado diretamente contra a lei” (Direito  Administrativo, Editora Atlas, 2004, 17ª edição, p. 666).

As MP/leis de efeitos concretos, embora com conteúdo de ato administrativo, são consideradas leis porque possuem imperatividade (obrigatoriedade) e normatividade (atribuem poder ou dever de fazer ou de não fazer) que se deu na MP/CFEM em que seus artigos estabeleceram nova alíquotas de CFEM, multa, forma de recolhimento porém, diferentemente das leis em sentido próprio, possuem concretude e individualização ao minerador.

Os atos administrativos com efeitos concretos editados sob a forma de Lei são passíveis de controle concentrado de constitucionalidade. Na ADI-MC 4048, o Ministro Marco Aurélio de Mello também se manifestou favorável ao controle dos requisitos de relevância e urgência pelo STF.

In casu, MP nº. 789/2017, ao propor mudanças no percentual da alíquota da CFEM, multas, tratou de fixar, por intermédio de norma pessoal (extração/minerador) e concreta, os efeitos dela decorrentes, são concretos ao minerador. Assim, o caráter individual da MP de alcance certo e não genérico, sendo possível de ser amparada pela via do mandado de segurança. Está claro, pois, que a produção de efeitos concretos pela Medida Provisória não depende de uma série de atos ulteriores, em diversas esferas de competência.

O Presidente da República deve editar Medidas Provisórias apenas, em casos emergenciais para suprir necessidade inadiável ou evitar grave dano ao país. Esse ato normativo não pode ser utilizado como regra no processo legislativo, como parece vem sendo. Trata-se de providência excepcional a ser usada apenas quando inafastável, assim a MP nº. 789/2017, não preenche os requisitos de legalidade para sua edição, sendo ilegal e podendo ser combatida mediante Mandado de Segurança.

(*) Valmor T. Bremm, fundador da Advocacia Bremm e presidente do Instituto de Direito Minerário da Região Sul e Mercosul.